Milímetro

Largo tudo, se você me prometer
se agarrar em mim.



A gente pode se casar de novo. De brincadeirinha como quando tínhamos seis anos, e brincar de estar brincando aos sessenta. A gente pode se casar aos dezesseis. Aos vinte e seis, de seis em seis, das seis as seis. Na Grécia, em Paris, na Praia, na catedral, na Av. Paulista, na casinha da árvore. E eu quero te procurar na chuva, te procurar no tapete, vestir suas camisetas, e bagunçar seus discos, me irritar com você, e fugir. E fugirmos juntos. Brigar pelo controle, pela parede da sala, pela sobremesa, e perdermos o controle juntos no sofá. E te olhar da janela enquanto você rega o jardim, e te olhar quando você não fizer nada, e beijar seus ombros. E morder suas costas, e te dar a mão, a boca, o peito, os olhos, e não te dar nada. E não pedir nada, e sermos tudo, sermos um, sermos todos, sermos loucos, sermos nós.

Ouvir sobre seu dia, e chorar pelo meu, e te contar sobre aula, e sobre minhas paranoias. Criticar seu filme favorito, e não poder ver o meu, odiar suas caras, amar suas bocas, comprar discos que não serão ouvidos. Sermos ouvidos, e cheiros e tatos. Rir dos seus retratos, e te mostrar os meus, e sentir saudades durante o almoço, mas te deixar tirar um cochilo, ouvir a narração do seu torneio favorito que disputa final no dia seguinte, ouvir triste suas desculpas, e te pedir desculpas tristes. E ficar feliz quando você entende. E odiar suas meias, amar seus meios, sentir frio quando você não me oferecer seu moletom, e sentir calor quando você não pedir para tirá-lo. Ficar te olhando enquanto você pinta um quadro, dizer que é uma arte fazendo outra, que adoro seus olhos, suas sardas, suas coxas.

Odiar os seus vícios, e ficar feliz por suportar os meus. Ficar escrevendo até você voltar, ficar escrevendo sobre você chegar. Escrever nosso aconchego. E te dar mais perfumes do que você usa, e decorar todos eles. Ler Freud durante o piquenique, e ler Lispector, e ler suas cores, e suas curvas. E me arrepender pelos meus surtos, e me alegrar quando você entende. Ouvir sua voz pela manhã, e seu silêncio pela noite, ler suas cartas no seu timbre, e me assustar com seu silêncio. E adorar suas manias, e ajeitar suas manhas, te falar sobre a novela, e sobre um casal 'que era novelo'. E te abraçar quando estiver cansado, e te aguentar quando estiver triste. E te pedir pra ir embora, e ficar te esperando voltar. 

Cantar no seu ouvido, e te abraçar no campo. Combinar os nossos signos, e descombinar nossos pijamas. Contornar as linhas das suas tatuagens com as pontas dos dedos. Guardar seu nome na ponta da língua. E ter ciúme de você, e me preocupar com seus atrasos, e festejar suas vitórias. E te dar todos os motivos pra ir embora, e te ver ficando. E ficar com você, ficar com você no lado mais alto da montanha vendo o pôr-do-sol e te cantar Cazuza. E ouvir as músicas que eu amo, e também as que eu odeio. Entrar no carro e ligar na minha rádio favorita. E apostar todas as fichas, e me perder pra você. 

Desarrumar suas coleções, e suas luvas, ajeitar nossos caminhos, te escrever um texto, te escrever uma música. E te dedicar uma música brega num karaokê barato, e te cantar here comes the sun, até chegar a lua. Ler seus livros favoritos, decorar um poema, te usar de travesseiro, te amar atravessado. E te falar sobre amor, sobre câncer, sobre cura, e te ajeitar na mala pra marcar com tachinhas meu mapa-múndi, e viajar em você. Quero te acampar no meu jardim, numa segunda-feira, e te falar sobre ser, sobre céu, sobre estrelas, e te contar pra elas. Quero te dar um anel, te dar saturno. E esperar por 29 dias, enquanto você não volta, e te amar por vinte e nove anos, por trinta vidas.

E te encontrar pra um café, e não reclamar quando você pedir sorvete. E te mostrar minha lista de sonhos, assim numa quarta feira de sol, e não querer que você me ajude a riscá-la, mas que escreva ainda mais. Quero te amar ao meio dia, e pela tarde, e em marte. Quero escrever nossos nomes numa parede da cidade, que é pra todo mundo ver que eu te amei, pra nossa história esbarrar em outras, quero tropeçar em você, e não me levantar nunca mais. Quero escrever um texto feito esse feito pela gente, feito gente. E organizar sua gaveta, e bagunçar sua cama. E te ouvir bravo por não entender meu medo, e choramingar pra te dizer um não, porque poucas pessoas conseguem te dizer não.

Quero te encontrar quinhentas vezes e me perder em todas elas. Quero sentir medo de amar, e te amar mesmo assim, te contar o incontável, e ficar, mesmo quando ir parecer mais fácil. E ir ficando. Mesmo você esperando que eu vá qualquer dia, mesmo eu sabendo que posso ir, quero escolher ficar, porque a vontade de morar no mundo é grande, mas a de morar em você é ainda maior. Quero te contar que é amor o nó em nossa volta, na minha volta, e rir por você não acreditar, mas é. Era desde o primeiro oi que você me disse. E escrever três futuros diferentes, amando desmedidamente cada milímetro seu. E te amar as pressas. E te amar as prosas. Derramar o chá, reamar. E te odiar todos os dias, te amando sempre um pouco mais.


[Escrito em um pedaço de folha qualquer arrancada de uma agenda velha, após uma conversa sobre os velhos tempos. Encontrei a folha perdida, mas me perdi fora da gaveta]

@tainazona_

[Resenha] Pobre Não Tem Sorte - Leila Rego

Autora: Leila Rego
Gênero: Chik-lit
Editora: All Print
Páginas: 244
2ª edição 
Toda garota do interior sonha em se casar com o cara de seus sonhos, ter uma casinha, filhos e ser feliz até que a morte os separe, certo? E se esse cara além de lindo, for rico, super fashion e divertido? E se tal "casinha dos sonhos" for um mega apartamento no melhor bairro da cidade? Uau! Mariana encontrou o cara perfeito e vai se casar com ele! E nada de casinha! Isso é coisa de gente que pensa pequeno. Mariana vai ter o apartamento dos sonhos que já vem incluso no pacote: case com um homem rico e vá morar em grande estilo. E quanto a filhos e ser feliz até que a morte os separe... Bem, ela ainda não pensou nesses detalhes. Afinal as prioridades vão para as coisas bem mais interessantes como, por exemplo, o vestido de noiva perfeito, o que o colunista vai dizer sobre o seu casamento no tablóide de domingo, o que as amigas e inimigas irão comentar, quem entrará na lista de convidados para sua despedida de solteira, etc. O relacionamento pode esperar mais um pouquinho, depois o Edu conta o que quer contar, mas isso dura só até o dia em que...Leiam o livro e descubram também.

Julho de 2013 e ainda tem quem pense que Chick-lit é um gênero literário para moças em crise existencial, se você é um dos que assim pensam, tenha a sensibilidade de me ouvir até o final do post, afinal é um caso de experiência própria. Nunca fui fã do gênero, não sei se por realmente ser uma moça em crise, ou por não ter tido oportunidade de ler algo do tipo. Eis que me deparo com um livro chamado POBRE NÃO TEM SORTE (PNTS, para os íntimos). Devo confessar, é realmente fabuloso. Como diria Mari, isso devia sair numa coluna social.

Leila Rego, traz em PNTS o humor, e a ironia presente na crítica que faz aos fúteis de plantão e nos mostra, garantindo boas risadas, que a futilidade e o consumismo anda mesmo demodé. Esse chick-lit ensina mais que muita fábula por aí, viu moçada? 


Comecei a ler o livro no caminho para a escola, assim como a Mari também não tive a sorte de ter nascido rica, e ando de ônibus. E nesses dois dias de leitura, a viagem no ônibus se tornou o momento mais divertido do dia, ficava o dia todo pensando no que a protagonista aprontaria. É uma leitura bem leve, com referências atuais, e termos do tipo "uó" e "dita-cuja". Outra coisa que me fez amar de imediato o livro, foi a referência às músicas do Nando Reis, não sei se já expressei aqui, mas sou apeixonadérrima por ele. E logo no início do livro vemos um trechinho de Sou Dela, e depois Mari entra na fossa ao som de Por Onde Andei.


Falando em Mari, essa protagonista realmente me cativou, ela quer ser rica, mas não é. Mariana Louveira, viciada em sapatos, roupas de grife, espaço em colunas sociais, e louca pra ter uma Louis Vuitton, mora em Prudente uma cidade onde o P.O.V.O é realmente um problema. Mariana é o tipo de protagonista que vai te deixar morrendo de raiva com tamanha futilidade, mas ao fim do livro você terá saudades dela, como se ela fosse uma velha amiga, ou até mesmo por ela estar bem aí, dentro de você. Mari, esta numa vida corrida, afinal ter que cuidar do casamento, da decoração do novo apê, e do trabalho não é tarefa fácil não é? E como é uma boa solucionadora de problemas, decide logo largar o emprego. E nesse turbilhão de coisas ainda tem o Edu, afinal não existe casamento sem noivo, não é?


Edu é o típico personagem que te deixa babando da primeira à última aparição no livro, sim, ele até se parece muito com alguém que conheço, que de tão perfeito chega a ser injusto. Afinal, ele tem muito de duas coisas que só se pode ter uma. Além de lindo, é inteligente, formado em medicina. E detalhe; é rico. O que está na lista de prioridades da Mari. Nosso queridinho ainda tem tempo pra ser fofo. Falta alguma coisa?  É um verdadeiro cavalheiro com a mãe, e um príncipe com a Mari. 


As coisas vão muito bem, finalmente ela vai se casar, e corrigir o erro que o Sr. Destino cometeu, mal pode esperar pra sair do bairro 'uó' e ir morar no apartamento novo. Mas como pobre não tem sorte, as coisas vão sair do eixo, e tudo vai desmoronar de vez, bem no dia do seu tão sonhado casamento. Adeus, ascensão social. Agora ela vai ter que escolher; continuar sendo a mesma mimada de sempre, e conviver com as dívidas e o fato de ter perdido o homem perfeito. Além dos comentários do P.O.V.O é claro. Ou amadurece de vez.

O livro começa do meio, no ápice eu diria, e aos poucos os personagens vão sendo apresentados. E se você acha que sabe, por esse resumo que fiz, o que acontece no final, te garanto, você se engana! É o tipo de livro que se não existisse o segundo volume eu iria implorar por um, já que estou morrendo de curiosidade pra saber o que vem depois. O mais engraçado, e olha que tem muita coisa engraçada, é que querendo ou não, mesmo morrendo de raiva, todo mundo se identifica um pouquinho com a Mari, quem nunca quis ser chic de doer, ou comprar algo que não pode pagar? E o livro até faz uma referência ao Determinismo, como eu pude interpretar.


Vi muitas resenhas falando mal de PNTS, reclamando dos erros, e da narrativa, bom creio que tais resenhistas não entraram de verdade na história. Vi poucos erros, e a escrita é bem leve. É uma tarde com as amigas. Imprevisível, engraçado, crítico, e real...tudo isso sem descer do salto. PNTS, é uma verdadeira lição. A disputa entre preços e valores. Quem ganha?


Me apaixonei pelo livro, e mal posso esperar pra ler o volume dois, adorei a Mari, to apaixonada pelo Edu, quero uma amiga como a Clara. Adorei a escrita da Leila, e ah, não podia deixar de citar novamente as referências musicais, não é?


Recomendo, afinal tem muita gente precisando ler esse livro hein....

E vocês, já leram? O que acharam? 
Me conte nos comentários.

"O “P.O.V.O. – Pessoas Ocupadas (demais) com a Vida dos Outros” – é uma raça muito cruel. E a raça P.O.V.O. do tipo “interior” é duas vezes mais cruel!"

"Mas, não sou rica. Não sou mesmo. E esse é o meu carma. Sabe de quem é a culpa? Do Sr. Destino. É verdade. O infeliz estava totalmente distraído quando chegou a minha vez de nascer."

"Quando abri a porta de casa, veio a surpresa: o Funk estava saindo do som da minha sala. E, totalmente entregue ao pancadão, estava Cida rebolando com as mãos no joelho, numa pose quase pornográfica"


Sobre a autora: Leila Rego nasceu em 1974, morou em Alta Floresta, onde não havia nem mesmo energia elétrica, sua infância foi repleta de histórias, livros e brincadeiras. Cursou turismo (assim como a Mari), e atualmente vive no interior de São Paulo, com o marido e os dois filhos. Escreveu Pobre Não tem Sorte, e Pobre Não Tem Sorte 2, e participou do projeto Novas Letras. Conheça o site da autora.

2x1

                                                                                                                                                           Para alguém que amei às prosas,
                                                                                                                       que  amei às pressas.


Tenho me cansado muito, você sabe, se tem uma coisa que me parece imutável, é essa minha mania de abrigar na rotina mais dias que de fato possuo. Além dos pequenos post-its ainda pregados no armário, que me dizem o que fazer, e que horas dormir. Sempre existe um espaço entre uma coisa e outra, que não exige bilhete de anotação, ou qualquer despertador no telefone. É nessa hora (e também em meio as outras) que penso em você.

Você sabe, tenho me cansado muito. Mas se tem uma coisa que não muda, é essa minha mania de pensar em você. E em seguida penso, num chão bem grande e bem largo, que é pra você poder espalhar seus livros, e bagunçar o tapete. Colocar na vitrola velha, um cd antigo do Cazuza. E ficarmos ali, os dois. Você ainda gosta de Cazuza, não é? Era ouvindo as canções dele, que a gente costumava sermos nós. Sermos nós, você lembra? Era ao som de Cazuza, que a gente se juntava àquela colcha de retalhos feita à mão. E remendava nosso não-amor feito à pé. Feito à língua. Feito à dedos. Feito às coxas. Feito à braços, e abraços. Aos trancos e barrancos. E em dias de chuvas. Dias de muita chuva. E ficávamos ali, ensopados de nós mesmos. Era Cazuza que a gente ouvia em dias de sol. E quando fazia muito calor, ficávamos ali despindo nossas roupas, e vestindo o sentimento um do outro.

Não sei se você se lembra, talvez o tempo, o cansaço, o ócio, a rotina e o resto, tenha lhe apagado as lembranças, você com uma memória tão boa, possa ter esquecido. E isso sempre foi o diferente entre nós, nunca soube bem das datas, dos dias, das horas, e minha memória ruim, entre um chá e outro só faz lembrar. Era ali naquele espaço dois por dois, que costumávamos sermos um. E, que agora sendo eu só, tendo a ser dois. Tendo a ser nós. Que não atam nem desatam. Era ali, ao som de Cazuza, que você me contava o incontável, e nosso silêncio calava os ruídos lá de fora. Quando acabava a música, a gente mapeava o depois do nosso agora. E de repente o noticiário da tv, não dizia nada, era ali, naquele espaço dois por dois, cabendo um, que o mundo girava.

Penso muito em você, talvez eu pense mais depois da seis, do que pela manhã, talvez eu pense das seis as seis. E no inverno. E embora faça frio, são pensamentos que porque não esqueço aquecem, e é sua veste que me faz companhia. Fico ali, me aninhando ao nosso tapete, que era tão minúsculo para nossas histórias, e que agora abriga uma saudade inteira. E ficamos ali, eu e ela. Sendo mais ela, do que eu. E quem eu era, mesmo?

Talvez você também não saiba responder, por falta de tempo. Pelo cansaço. Pelo cheiro das nossas rotinas fatigantes. Você não saiba responder. Talvez a linha que divide nossos atuais hemisférios, tenha deletado de você, pouco mais do que sua língua nativa. E tenha trazido pra mim, uma saudade do tamanho de nós dois. Você sabe, as coisas sempre pendem para o sul. Mas se por acaso, por descuido de memória, saiba, e mesmo assim não queira responder, eu entendo. E vou te entender e atender sempre que quiser me ligar, mesmo que não saiba com quem se fala. Eu vou te dizer, o que mesmo nunca tendo dito antes, eu te disse sempre.

E que no fim do dia, dessa minha rotina fatigada, é sobre seu peito de poesias cansadas, que quero descansar minhas retinas, e todo o resto.

[ Escrito numa quinta-feira, sem chuva. E sem sol. Sobre o tapete, e sob os ruídos lá de fora. Aconselho a ouvir o som baixinho, ao pé do ouvido e das letras.]

Espero que gostem do texto, e também das novidades que venho preparando que em breve divulgarei aqui na fan page, e se gostar continue em casa, curtindo a page, beijos
 

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